Em plena crise, o pensamento inquieta-se e interroga-se; ele pesquisa as causas mais profundas do mal que atinge a nossa vida social, politica, económica e moral.
As correntes de ideias, de sentimentos e interesses chocam brutalmente, e deste choque resulta um estado de perturbação, de confusão e de desordem que paralisa toda a iniciativa e se traduz na incapacidade de encontrarmos soluções para os nossos males.
Portugal perdeu a consciência de si mesmo, da sua origem, do seu génio e do seu papel, de herói intrépido, no mundo. Chegou a hora do despertar, do renascimento, de eliminar a triste herança que os povos do velho mundo nos deixaram, as bafientas formas de opressão monárquicas e teocráticas, a centralização burocrática e administrativa latina, com as habilidades, os subterfúgios da sua politica e dos seus vícios, toda esta corrupção que nos tolda a alma e a mente.
Para reencontrar a unidade moral, a nossa própria consciência, o sentido profundo do nosso papel e do nosso destino, isto é, tudo o que torna uma nação forte, bastaria a nós portugueses eliminar as falsas teorias e os sofismas que nos obscurecem o caminho de ascensão à luz, voltando à nossa própria natureza. Às nossas origens étnicas, ao nosso génio primitivo, numa palavra, à rica e ancestral tradição lusitana e/ou celtibera, agora enriquecida pelo trabalho e o progresso dos séculos.
Um país, uma nação, um povo sem conhecimento, saliência do seu passado histórico, origem e cultura, é como uma árvore sem raízes. Estéril e incapaz de dar frutos.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Religiões, Crenças, Doutrinas e Filosofias Religiosas do Mundo (Parte I)

 Alquimia


      O termo alquimia deriva do árabe khem, uma antiga palavra que significa Egipto, tornando-o assim em Arte do Egipto ou magia. É também conhecida como a arte real. Superficialmente, contudo, a alquimia apareceu sempre mais como uma forma primitiva de química do que como um ramo das artes mágicas, embora os alquimistas mediáveis europeus dedicassem muito do seu tempo a pesquisas fabulosas como a procura da pedra filosofal que podia transformar chumbo em ouro, curar todas as doenças e garantir a imortalidade.
O fundamento filosófico da alquimia deriva de influencias clássicas grgas e gnósticas. O psicólogo Carl Jung, entre outros, sugeriu que os obscuros e, muitas vezes, codificados relatos de experiencias alquímicas ocultavam um sistema profundo de desenvolvimento espiritual, uma teoria que atraiu um interesse generalizado.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espirito

Alquimia Taoista


Um curioso sistema de ioga esotérico desenvolvido na China. Os praticantes acreditam que a vontade individual não sobrevive fisicamente à morte, a menos que quem o pretende tenha tido o cuidado de preparar um corpo de diamante como veículo imortal para o espírito.
O corpo de diamante parece estar relacionado com o corpo astral do ocultismo ocidental, mas reforçado e fortalecido durante a vida do adepto por uma mistura dos potenciais sexuais masculino e feminino.
Os praticantes da alquimia taoista de mente mais literal compuseram uma pílula de cinábrio composta de, entre outros ingredientes, sémen e fluido lubrificante da vagina, Uma segunda escola de pensamento dentro do sistema insiste em que o segredo real está na mistura das energias ch’i masculina e feminina.
Ambos os tipos de adeptos masculinos praticam Karezza com uma multiplicidade de parceiras para conseguirem os seus fins. Acredita-se comumente que o orgasmo dissipa a energia vital nos homens, mas que as mulheres estão abençoadas com um suprimento inexaurível. Consequentemente na cópula alquímica taoista, o homem evita rigorosamente o seu orgasmo, enquanto o encoraja na mulher.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espírito

Animismo


Um dos mais antigos sistemas de crenças, o animismo sustenta que toda a natureza está essencialmente viva com espíritos ou divindades habitando árvores, rios, montanhas, formações rochosas naturais e mesmo certas ferramentas ou armas.
As crenças animistas mantêm-se muito divulgadas entre as sociedades primitivas, particularmente naquelas em que se acredita que muitos seres espirituais controlam vários aspectos do ambiente natural e social.
O conceito de animismo foi desenvolvido no final do século XIX pelo antropólogo britânico Sir Edward B. Tylor, que via essas crenças como o primeiro estado da evolução da religião. Criou a teoria de que os sonhos, trnses e a observação da morte levou os povos primitivos a acreditarem numa alma, sendo depois essa crença projectada para o mundo natural. Tylor considerou então que a crença no animismo levou à definição de divindades mais generalizadas e, eventualmente, à adoração de um deus único.
Embora esta visão evolucionista da religião esteja largamente desacreditada, os psicólogos modernos tendem a apoiar aspectos da teoria de Tylor ao concluírem que o animismo provém de uma projecção do conteúdo do inconsciente. Segundo este ponto de vista, quando um primitivo comunica, põe exemplo, com um espírito da árvore, está de facto a experimentar a realidade de uma voz interior. Contudo, com conceitos como o de Gaia e o vigoroso ascender do neoxamanismo, foi dado um novo fôlego às teorias espíritas do animismo.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espirito

Antroposofia


Um sistema de ciência espiritual proposto pelo cientista e místico austríaco Rudolf Steiner. Depois de uma década de associação com a Sociedade Teosófica, separou-se em 1909 para fundar a sua própria Sociedade Antroposófica. O nome é derivado do grego – anthropos que significa homem e sophia que significa conhecimento.
A antroposofia fala da evolução da Terra através de sete épocas e de sete civilizações, sendo Ahriman e Lúcifer os eternos opositores ao progresso humano.
Numa escala mais pessoal, a antroposofia refere-se aos quatro corpos do indivíduo, à reencarnação e à vida no mundo do espírito entre as encarnações.
Steiner também desenvolveu um sistema de medicina antroposófica com uma combinação de herbalismo e hemeopatia, e incluía aconselhamento para o tratamento de problemas psicológicos e emocionais.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espirito

Astrologia


A astrologia é uma das mais antigas artes esotéricas. Foi praticada na Suméria, a mais antiga civilização do mundo, em 4300 a.C. e talvez tenha tido a sua origem na Pré-História, dado que há algumas provas do estudo do céu nocturno pelos povos da Idade da Pedra. É também, hoje em dia, uma das mais divulgadas artes esotéricas, embora numa forma adulterada e condenada pelos astrólogos mais sérios. Quase todos os jornais e revistas mais populares publicam uma coluna de astrologia, oferecendo previsões e conselhos a quem nasceu sob um dos 12 signos solares.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espirito

 Budismo


O primeiro sermão budista foi pregado em Benares, na Índia, cerca de 530 a.C. Quando o príncipe Siddartha Gautama, o Buda (ou O Iluminado) morreu, 45 anos depois, a religião que ele fundara tinha atraído centenas de monges e milhares de seguidores leigos. Continuou a crescer e a espalhar-se, criando raízes na China, Tibete, Japão, Birmânia e na maior parte do Sudeste asiático. Durante uns tempos floresceu mais no estrangeiro que na Índia natal, embora hoje em dia goze de um interesse renovado naquele país e seja geralmente aceite que influenciou profundamente o Hinduísmo.
O modelo fundamental do Budismo, que alguns consideram ser muito mais uma filosofia que uma religião, foi estabelecido no sermão de Benares, quando Gautama proclamou o Caminho do Meio entre os extremos de ascetismo e irreflectido hedonismo. O Caminho do Meio compreende as Oito Vias Nobres da Recta Visão, Rectas Intenções, Recto Discurso, Recta Acção. Recta Maneira de Viver, Recto Esforço. Recto Pensamento e Recta Concentração. Avia baseia-se nas Quatro Verdades Nobres: que toda a vida é sofrimento, que a causa do sofrimento é o desejo, que o sofrimento cessará quando o desejo cessar e que as Oito Vias Nobres levarão à cessação do desejo.
Qualquer pratica de budismo está indissoluvelmente ligado à doutrina da reencarnação e ao conceito de Karma. Os budistas acreditam que toda a humanidade está amarrada a um eterno ciclo de reencarnação após reencarnação, movida pelo Karma, e que a única forma de libertação é conseguir a iluminação, expressa no estado de êxtase do Nirvana. Este é conseguido seguindo as Oito Vias Nobres e praticando os Três ensinamentos: moralidade, concentração e sabedoria. O ensinamento vai para além da expressão de atitudes piedosas até aos domínios do ioga, fazendo do budismo, talvez, a mais esotérica das grandes religiões orientais.
Reconhece que a meditação pode produzir siddhis ou poderes psíquicos, geralmente divididos em seis categorias das quais as primeiras cinco são:
·        Poderes mágicos como a levitação, caminhar sobre a água, mudar de forma ou projectar um corpo feito pela mente.
·        Clauriaudiência, ou seja, a possibilidade de ouvir as vozes dos espíritos.
·        Telepatia, a capacidade de ler as mentes.
·        Memória anterior, a capacidade de recordar vidas passadas.
·        Clarividência, a capacidade de obter informações à distancia sem a intermediação do contacto mente a mente.
Acredita-se que estas cinco curiosas capacidades sejam a consequência natural da concentração treinada. A sexta, um tipo de animação suspensa, na qual todas as principais funções físicas param, acredita-se que venha somente da introspecção. Todas as seis são rejeitadas como distracções que devem ser ignoradas para se obter o objectivo central do nirvana.
Mas esta rejeição é um fenómeno relativamente recente. Parece haver poucas dúvidas de que o budismo primitivo, incluindo a vida do próprio Buda, tinha fortes elementos de xamanismo com poderes do género dos referidos e exercidos frequentemente para se obterem méritos.
Eileen Campbell e JH Brennan, in Dicionário da Mente, Corpo e Espirito

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

A missão de Portugal

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Turiacus

O Deus Nobre


A lápide que contém a inscrição dedicada a Turiacus encontra-se numa das paredes do claustro do Mosteiro de Santo Tirso. Segundo Leite de Vasconcelos, o nome da divindade teria a raiz tor, que em irlandês significa "senhor", "rei" e "nobre".

Existirá, provavelmente, uma ligação entre as divindades lusitanas Banda Velugus Toiraecus e Tueraeus.

Poderá também, hipoteticamente, existir uma ligação entre o nome da divindade e "Tirso". Sendo que a ara se encontra numa das paredes do Mosteiro, cuja formação remonta ao séc. X, o seu lugar de origem não deveria ser muito longe do mesmo. O próprio Mosteiro ou a localidade poderão bem encontrar a raiz do seu nome no desta divindade, que persistiria teimosamente nos séculos vindouros sob o nome de um santo cristão - processo que aconteceu, aliás, com várias divindades pré-cristãs.

O Deus Javali/Guerreiro


Para além da leitura atrás referida (que nada de concreto nos diz), muito pouco se sabe sobre o significado desta divindade. Lancemos, assim, uma hipótese: torc significa, tanto em irlandês como em gaélico escocês, "javali". Pelo seu carácter selvagem e destemido, eram reconhecidas qualidades guerreiras neste animal pelos povos antigos. Não será, então, de estranhar, que o dedicante, Lúcio Valério Silvano, fosse um soldado que, para além disso, fez parte da VI Legião, que esteve na Hispânia Terraconense e recebeu o epíteto de Victrix ("Vencedora") após ter vencido os Cantabros! Turiacus poderia assim significar "o deus javali" ou "o deus forte como um javali", que teria escutado o pedido do dedicante para ter coragem, ser vitorioso ou, simplesmente, sobreviver em batalha. Este terá cumprido "de boa mente" o seu voto, consagrando-lhe uma ara.

É igualmente interessante reparar na semelhança fonética do termo torque, que se refere a uma espécie de colar empregue pelos guerreiros lusitanos, como é visível em vários monólitos esculpidos encontrados em territórios português. A natureza guerreira desta palavra é, assim, uma vez mais atestada.

Alexandre Gabriel
Mandrágora - O Almanaque Pagão 2009 - Usos e Costumes Mágicos da Lusitânia

A simbologia dos Elementos

Os Elementos


A importância central dos elementos como princípios organizadores no universo é uma constante na simbologia de todas as culturas.
Os povos antigos acreditavam que os elementos eram forças de energia que sustentavam o mundo. No Ocidente havia quatro: fogo, água, ar e terra. No oriente um quinto ( metal na china; "eter", um elemento espiritual, na Índia e no Tibete).  Os alquimista representavam cada elemento por um triângulo, os elementos engendravam todas as coisas, incluindo o corpo humano - carne (terra), respiração (ar), calor (fogo) e sangue (água) - e o bem-estar físico e psicológico de cada pessoa era uma questão de os manter em equilíbrio, do mesmo modo que era necessário equilíbrio no mundo exterior.

Composto pelos quatro elementos,além da dimensão espiritual invisível, o corpo (masculino) era o símbolo universal da vidaem todas as suas formas, a ligação entre o céu e a terra e personificação da energia dos deuses.

Eelementais



Espíritos não humanos da natureza, de que há quatro grupos princípais, associados a cada elemento: anões e gnomos (terra); salamandras e dragões (fogo); silfos, faunos e dríades (ar e florestas); ondinas (água e rios).
Os gnomos são os espíritos da terra. Maliciosos por natureza, no entanto se lhes ofertarmos algo estes podem nos recompensar com inemagináveis e maravilhosos tesouros.


Nas tradições ocidentais, as salamandras são os espíritos guardiães do fogo, os quais habitavam em vulcões.


Os espíritos do ar em comunhão com o divino.


Ondinas, os espíritos femininos das águas, tão cativantes quanto traiçoeiras.



Fonte: A linguagem dos símbolos - David Fontana - Editorial Estampa





terça-feira, 13 de novembro de 2012

Gwydion

Gwydion é uma banda portuguesa de metal.
Iniciou em 1995, um projecto fundado por um grupo de amigos que partilhavam a mesma paixão pelo metal e interesse nas culturas celtica e nórdica. Durante essas primeiras fases da banda, três demos foram apresentados ao cenário do metal Português e dezenas de shows foram realizados em Portugal.


Em 2007, Gwydion gravou seu primeiro álbum Ynys Môn., lançado pelo selo alemão Trollzorn.


 Com Ynys Mon, Gwydion, recebeu um convite para fazer uma turné europeia em Outubro de 2008, com bandas de topo TYR, Hollenthon, Alestorm e Svartsot a Tournée RAGNAROK AASKEREIA'S.


 Durante 2009, Gwydion toucou em diversos festivais de metal do metal português. No final do ano, Gwydion terminou as gravações e produção de seu segundo álbum, Horn Triskelion, foi gravado e produzido no Pentágon Studios por Fernando Matias dos F.e.v.e.r. , e mixado e masterizado em Oslo, Noruega no TopRoomStudio por Børge Finstad. Alguns convidados especiais do estúdio também fez contribuições originais com sonoridades e melodias.

3000 Visitas

O Lusitaniae Castrum atingiu as 3000 visitas, por tal está de parabéns!
The Lusitaniae Castrum reached the 3,000 hits, for such is to be congratulated!


3000 é um numero bem redondo!
3000 is a very round number!
Conto com vocês para fazer dele o número de visitas diárias!
I count on you to make him the number of daily visits!
Obrigado a todos!
Thank you all!


sábado, 3 de novembro de 2012

O DESTINO DO GÉNIO


Quanto mais nobre o génio, menos nobre o destino.
Um pequeno génio ganha a fama,
um grande génio ganha o descrédito,
um génio ainda maior ganha o desprezo;
um deus ganha a crucificação.
FERNANDO PESSOA

A pré-História na Península Ibérica


A pré-História da Península Ibérica iniciou-se com a chegada dos primeiros hominídeos à península Ibérica há cerca de 1,2 milhões de anos e durou até o início das guerras Púnicas, quando o território entrou no domínio da história escrita. Neste período alguns dos marcos notáveis são:
Ter sido o último reduto do homem neandertal antes da sua extinção; Registar alguns dos mais impressionantes exemplos de arte paleolítica à par da França; Acolher as mais antigas civilizações da Europa ocidental, sendo um apetecível território a que afluiram vários povos, pela posição estratégica e as muitas riquezas minerais.
No estudo da pré-história existe o problema fundamental que dificulta sua investigação: estabelecer a cronologia exata, principalmente das datas referentes aos primeiros habitantes, sua procedência, relacão étnica com os diferentes tipos pré-históricos e sua localização.

O carácter penínsular, limitado pelo Atlântico a oeste e pela barreira natural dos Pirinéus criou um isolamento em relação à restante Europa Continental, que em algumas ocasiões contribuiu para originar uma relativa separação entre a evolução da Península Ibérica e da restante Europa. A localização geográfica constituiu porém a ponte que une a Europa ao norte da África, formando uma conexão entre os continentes africano e europeu. Outro condicionador foi a influência dupla do mar, com a ligação tanto ao oceano Atlântico como ao mar Mediterrâneo.
No interior a acção dos rios, mais caudalosos que actualmente, produziu planícies fluviais que propiciaram um ambiente favorável para o homem. Também está provado que existiu uma actividade vulcânica, sobretudo nas zonas da atual província de Ciudad Real e de Gerunda.
O clima deixou de mudar à medida que se desenrolaram alternadamente as quatro eras glaciais e as eras interglaciais. Apesar das glaciações terem sido diferentes entre si, em geral pode dizer-se que na Meseta havia um clima mais extremo e chuvoso que agora, comparável ao existente na Polônia ou Rússia atuais. A costa cantábrica era muito mais fria e húmida, similar ao atual norte da Escócia, e a população da Andaluzia gozaria de um clima mais frio que o do sul da França. Durante os períodos interglaciais, este último seria o clima da costa cantábrica, enquanto Andaluzia seria muito ensolarada e a região levantina teria um clima semi-árido.


Levando em conta que a maior atividade dos habitantes da Ibéria consistia em caça, cabe mencionar as mudanças que a fauna ibérica teve com as mudanças climáticas. Nos períodos glaciais os animais característicos foram o mamute, o rinoceronte peludo e a Rena, espécies vindas do centro e norte da Europa que buscavam o clima relativamente ameno da península. Durante os períodos interglaciais, o elefante meridional, o elefante antigo e o rinoceronte de Merk foram os animais mais comuns. Indiferentes a todas as mudanças climáticas, também havia outros animais como ursos, lobos, cavalos, bisontes, javalis e cabras,
Todos estes fenômenos geraram uma variedade cultural, de vida e mentalidades que explicam a diversidade permanente do território peninsular.

Pé na terra

Pé na terra é um grupo musical de música folclórica português que surgiu em 2005 na cidade do Porto. Com dois discos lançados o grupo, hoje um quinteto, aborda temas tradicionais da música de Portugal.


Os Pé na Terra hoje são um quinteto, mas quando surgiram em 2005, na cidade do Porto, eram um trio composto pelo núcleo: Cristina Castro (voz, acordeão e percussão), Ricardo Coelho (gaita-de-foles e flautas) e Tiago Soares (bateria e percussão).


Meses depois, a 1 de Abril de 2006, a banda deu o seu primeiro concerto no bar portuense Contagiarte, já com os novos membros: Tânia Pires (bandolim, melódica e voz), Rui Leal (contra-baixo) e Rui Pedro (guitarra clássica e guitarra portuguesa). O sexteto atuou nos festivais “Granitos Folk” (Porto), “Andanças” (S. Pedro do Sul) e participou na primeira incursão no panorama folk internacional no prestigiado “Festigal” em Santiago de Compostela.

Em 2007, saem de cena Tânia Pires, Rui Leal e Rui Pedro e chegam ao seio da banda: Adérito Pinto (baixo) e Hélio Ribeiro (guitarras e gaitas de foles). Dois músicos de Paços de Ferreira oriundos de outros géneros musicais com o rock e o heavy-metal. Na bagagem trazem as suas influências mais eléctricas injectando uma nova energia no som mais tradicional do trio original.

O álbum de estreia Pé na Terra foi lançado em 2007. Em 2008 a banda participou no concurso nacional do Eurofolk’J 08.

Entre 2007 e 2009, os Pé na Terra deu perto de 100 concertos. Correndo Portugal de lés a lés, o grupo viajou também até Espanha para actuar no “EuroFolk Festival” em Málaga, Espanha e no “EuroFolk J, Maiollati Spontini”, em Ancona, Itália.

Em 2009, através da Associação Adriano Correia de Oliveira, os Pé na Terra foram convidados a actuar num concerto em homenagem ao cantautor reinterpretando 3 temas da obra deste. Em 2010 o grupo lançou o seu segundo disco, simplesmente intitulado: 13, com a ajuda do engenheiro de som e produtor Pedro Rangel.

O grupo tem actuado regularmente em Portugal continental, Madeira e Açores com algumas incursões pelo estrangeiro. Bélgica, França, Itália, Espanha.

Durbedicus

O Deus das Águas


A ara que contém a única inscrição conhecida dedicada ao deus lusitano Durbedicus foi encontrada por Martins Sarmento em 1881, na torre da igreja de Ronfe, em Guimarães. Actualmente encontra-se exposta no Museu de Guimarães.

Existem várias interpretações sobre o significado de Durbedicus, embora a maioria dos autores esteja de acordo em atribuir-lhe um carácter aquático.

Adolfo Coelho interpreta o nome desta divindade como "o que goteja" ou que "faz gotejar". Diz-nos ainda que esta "denominação conviria a um deus dessas fontes escassas que muitas vezes são consideradas como em extremo milagrosas". Por outro lado afirma que este nome poderá igualmente ligar-se ao "antigo irlandês derb - 'certo', 'verdadeiro', 'ilustre'".

Segundo Leite de Vasconcelos, Durbedicus seria "um deus aquático - ou de uma fonte, ou do rio Avus, que passa perto de Ronfe". Vasconcelos associa ainda o prefiro durb- aos termos irlandeses dobor, dobur e dobhar, que significam "água", e refere o nome de dois rios com esta mesma raiz: Durbis (Bretanha) e Durbiae (Gália)

O Deus Muito Vitorioso

 
Para além destas interpretações já conhecidas, que nos seja permitido, porém, lançar mais algumas hipóteses, decompondo Durbedicus em Dur-Bedicus, ao contrário da habitual decomposição a partir de Durb-. Em irlandês antigo, Duir significa "carvalho" e "forte". É igualmente associável ao português "duro", também ligado à noção de "força". A raiz indo-europeia Dru- representa a palavra "muito" (análogo ao francês trés). Por outro lado, a raiz celta bouda significa "vitória" e o escocês buaidheach "eficiente". Lembremo-nos do nome da famosa raina celta Boudica, que liderou uma revolta contra a invasão romana na Grã-Bretanha, cujo nome significa "vitoriosa". Existe inclusive uma inscrição com o nome Boudica na Lusitânia. Por esta ordem de ideias, somos tentados a interpretar Dur-Bedicus como o "muito vitorioso", "carvalho da vitória/força". Duberdicus poderia assim ser uma divindade guerreira à qual a tribo apelaria para vencer nos combates.

Alexandre Gabriel
Mandrágora - O Almanaque Pagão 2009 - Usos e Costumes Mágicos da Lusitânia
Fonte:
http://branmorrighan.blogspot.pt/2012/11/deuseslusitanosduberdicus.htmlutm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed:+Morrighan+(Morrighan
)

Mu


Os MU iniciaram o seu percurso musical em 2003. Em busca de fusão e de experimentação no seio da música tradicional, muitos foram, e continuam a ser, os estilos que caracterizam esta banda portuguesa. Os seus membros dedicam-se aos mais variados instrumentos provenientes dos quatro cantos do mundo, o que permite a este projecto viajar por distintas culturas e sonoridades tradicionais e de fusão. A junção de instrumentos oriundos da Índia, Suécia, Egipto, Brasil, Marrocos, Austrália, entre outros, permitiu aos MU descobrir na música uma viagem por mundos perdidos e resgatá-los até à actualidade.


Entre danças esvoaçantes, vozes femininas e instrumentos variados, os MU criam ao vivo um momento de alegria contagiante. Nos seus espectáculos, a energia viaja no ar, e invade os corpos impelindo-os a dançar num mundo sem limites.

Ao longo do seu percurso, os MU contam já com dois trabalhos discográficos, Mundanças (2005) e Casanostra (2008).

A nível nacional, destaca-se a sua vitória no concurso de musica folk Arribas Folk e a sua participação em diversos festivais de "world music" de renome internacional, sendo eles: Sons do Atlântico, Boom Festival, Festival Internacional dos Gigantes, Ollin Kan, Portugal a Rufar, Festival Intercéltico do Porto, Andanças e Festival Intercéltico de Sendim. A nível internacional, destaca-se a sua participação nos seguintes festivais: Danzas Sin Fronteras (Espanha), Festigal (Santiago de Compostela, Espanha), Festival Folk Plasencia (Plasencia, Espanha), Festival La Carlota (Córdoba, Espanha), Festival Galdames Folk (Galdames, Espanha) e Zgetno Festival (Zagreb, Croácia)e em Bucareste, Roménia.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Nemeteus

O Achado e a sua Decifração


Em 1940 foi descoberta uma inscrição no Castelo de São Jorge, em Lisboa, na qual claramente se pode ler NEMET [...]. Trata-se de um achado único, cujo nome não se encontra e mais nenhuma inscrição conhecida na Lusitânia. Curiosamente, esta divindade tem passado relativamente despercebida no que diz respeito a estudos mais aprofundados acerca da sua origem e significado.
Esta lápide encontra-se actualmente na Sala de Turismo do Castelo de São Jorge e, embora esteja algo maltratada pelo tempo, uma observação mais atenta permite-nos ainda "decifrar" uma outra letra que faz igualmente parte da mesma. Uma tentativa de reconstituição apresentada por José d'Encarnação é NEMETEVS. Tomemos, pois, esta palavra como o provável nome aqui referido.

 Termos Semelhantes


Para tentarmos compreender o significado do nome Nemeteus, procuremos alguns termos semelhantes cuja raiz é a língua celta: Nemeton (termo celta que significa "bosque sagrado" ou "santuário"), Nemetiuse Nemetona (deuses dos bosques sagrados, encontram-e em inscrições gaulesas, britânicas e germânicas), Nemetes (tribo celta-germânica), Nemtati (tribo lusitana), Nemetóbriga (antigo povoado na Galiza), Vernemeton ("grande bosque sagrado", França), Nemetodurum (actual cidade de Nanterre, França), Drunemeton ("bosque sagrado dos carvalhos/druidas", Turquia).

 O Deus do Bosque


O facto de esta inscrição ter sido encontrada no Castelo de São Jorge, que se localiza numa das colinas da cidade, atingindo os 115m de altura, bem como a sua cumplicidade com os deuses do bosque Nemetius / Nemetona, o termo Nemeton e os outros acima indicdos, leva-nos a lançar uma hipótese: que este monte teria sido um verdadeiro Nemeton, um santuário natural, coberto por árvores ancestrais e sagrado para os povos da antiguidade. É sabido que os lusitanos prestavam cultos particulares às divindades no cimo dos montes e noutros santuarios naturais. Esta inscrição teria sido, assim, dedicada ao seu númen, Nemeteus, que seira o nome do genius loci, a divindade ou o espírito do lugar. Nemeteus seria o "deus do bosque", o "espírito da floresta", "o deus guardião do bosque sagrado", aí cultuado.


A.G. em Mandrágora - O Almanaque Pagão 2009 "Usos e Costumes Mágicos da Lusitânia"

Fonte: http://branmorrighan.blogspot.pt/2012/09/deuses-lusiatnos-nemeteus.html


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

O Rei Das Serpentes (Conto fantástico de minha autoria)

O Rei Das Serpentes

Após vários anos, errando pelas terras distantes do sul, enfrentando todo o tipo de vilões, salteadores, bandidos, assassinos e animais selvagens. Brigus regressava agora à terra que o vira nascer. Chovera copiosamente durante todo o dia, abrandando só pelo lusco-fusco. O terreno estava escorregadio e enlameado. A cada passo que dava as suas botas de pele de porco pareciam enterrar-se cada vez mais fundo. No entanto a perspectiva de passar outra noite ao relento não lhe agradava de todo. Em breve seria noite cerrada e não era uma simples terra barrenta que o iria impedir de pernoitar junto a uma desejável fogueira.
Consequentemente, instantes depois avistou o outeiro sobranceiro onde, apenas há três gerações, o clã do javali se havia estabelecido. Com a chegada da agricultura e da pastorícia que depressa se disseminaram por toda a Finisterra, não tiveram mais a necessidade de partirem a cada novo Inverno. Escolhendo assim aquela região cruzada por mil rios, repleta de árvores de fruto e abundante em caça, para se fixarem.
Estranhamente a pequena comunidade estava imersa num silêncio pavoroso. Facto pelo qual o jovem caçador, sentindo que poderia correr perigo, se deteve a meio caminho. Sem a protecção da vegetação do bosque, a brisa que se fazia sentir enregelou-lhe o pescoço desprotegido. Enquanto retirava a capa de linho grosso da sacola que carregava às costas, juntamente com a sua lança, perscrutou as imediações.
Apenas escutou o rumorejar do ribeiro confinante e nada mais. Os cães não ladraram à sua chegada e as crianças não vieram ao seu encontro, tal como é habitual quando um forasteiro chega a um lugar. No final da jornada diária acendiam-se as fogueiras, para cozinhar e contar histórias, no entanto não haviam quaisquer vestígios de fumo. Nas cercanias não crescia qualquer espécie de vegetação e os animais pareciam ter desaparecido como por magia. Afrouxando o cinturão de couro, para que pudesse puxar pelo punhal rapidamente, avançou.
A paliçada estava danificada em vários locais. A argila das choupanas estava gravemente fissurada e o colmo dos telhados descuidado. Tudo indicava ter havido ali um ataque. Porem, a avaliar pela a ausência de vestígios recentes e pela degradação do povoado, tal havia acontecido já há anos. Olhando em redor, Brigus avistou no lado oposto aquele em que estava, algumas dezenas de estátuas com forma humana. Uns pareciam fugir e outros pareciam lutar, mas todos exibiam uma expressão de horror. Algo muito tenebroso havia petrificado o seu clã.
De súbito, Brigus sentiu-se observado. Poisado num das vigas da paliçada, um corvo mirava-o atentamente. O caçador sentiu perigo e puxou pelo punhal. No interior de uma das choupanas algo se mexeu e o silêncio que imperava no local foi quebrado pelo ruído de uma peça de loiça a quebrar-se aparatosamente. O pássaro negro bateu asas e levantou voo. Ali podia estar a resposta para todo aquele mistério. Sem se deter, avançou destemidamente de punhal em riste.
Ao entrar na choupana o caçador reparou nos cacos de um cântaro de barro que estavam espalhados por toda a parte. O braseiro que existia ao centro da pequena habitação estava apagado, no entanto depois de o observar atentamente concluiu que não fazia muito que havia sido extinto. Junto a uma das paredes, junto a outros objectos de barro empilhados, estava uma manta de lã negra que cobria algo compacto. De súbito algo se movimentou debaixo da mesma, despertando a atenção do caçador. Ao puxar pela manta este deparou com um velho assustado, cadavérico e andrajoso que termia de pânico.
- Quem és tu, pobre criatura? – inquiriu decidido, mostrando assim que estava controlador da situação.
- Por favor não me faça mal, por favor! – suplicou o velho, atirando-se para os seus pés.
- Sou o filho mais novo de Quangeius, – revelou o caçador – Brigus. E tu quem és, afinal?
 - Pelos Deuses, julguei que fosses mais um mero salteador, – redarguiu o velho, recompondo a sua postura, – ultimamente têm passado muitos por aqui. Bem-vindo a casa, ou pelo menos aquilo que resta dela. Eu sou Caburoniq, não me reconheces jovem Brigus?
Brigus deu um passo atrás, esfregou os olhos e fixou o olhar no rosto do velho homem. A brisa agitou o colmo do telhado. Um pequeno cão, escanzelado e pelado, entrou na habitação, indo enroscar-se nas mantas que ali se achavam. O velho sorriu e o caçador colocou-lhe uma mão no ombro, retribuindo-lhe o sorriso.
- É bom reverte, meu sábio velho contador de histórias – disse alguns instantes depois. – Conta-me, então, o que por aqui se passou.
- Contarei se me trouxeres um pouco de lenha, em breve anoitecerá e ficará frio, devemos acender a fogueira.
- Vou, então, mas não demoro!
Caburoniq estendeu a Brigus uma pequena machada, com cabo de madeira e cabeça de sílex, apressando-se a ordenar a confusão em que estava a pequena cabana. O jovem caçador precipitou-se para o exterior e dirigiu-se para o bosque. A brisa estava agora incessante e à sua passagem as gentes de pedra pareceram gemer, implorando para que ele as libertasse da infeliz condição em que se achavam.
Por breves instantes, Brigus, deteve-se a observá-las, parecendo ver uma lágrima cristalina a deslizar suavemente pelo rosto de uma pequena menina, cuja mãe a segurava protectoramente ao colo. Julgando ser um devaneio da sua mente desviou o olhar, aconchegou a sua capa e foi buscar a lenha que o velho lhe pedira.   
Quando Brigus regressou à pequena habitação ocupada por Caburoniq, esta estava já recomposta. O velho dispôs a lenha cuidadosamente, no local a esta destinada e fez lume, colocando sobre este um crestado receptáculo de barro, no qual preparou um caldo de espargos. O pequeno cão chegou-se ao lume, procurando-se aquecer. Próximo da entrada, o jovem caçador observava o seu anfitrião, olhando por vezes para o exterior para se assegurar de que estavam sós. A sua intuição persistia em alertá-lo de que ali o perigo era constante.
- Está pronto – disse Caburoniq, quebrando o sinistro silêncio que se havia instalado.
- Há dias que desejava um abrigo e uma refeição quente, no entanto esta sensação de perigo iminente não me deixa apreciá-los comodamente – confessou o jovem.
- Desde do fatídico dia da tragédia que não acontece aqui nada, – revelou o velho –, a não ser a visita inusitada de um ou outro salteador.
- Acredito em ti, mas o meu instinto de caçador diz-me desde que aqui cheguei que estou a ser observado.
- São os espiões dele – revelou o velho.
- Os espiões de quem?
- Do rei das serpentes!
- Mas afinal quem é esse rei das serpentes e o que se passou aqui?
- Vou então contar-te tudo. A velha sapiente que indicou estas terras ao teu pai para estabelecer o clã, esqueceu-se de lhe dizer que estas já eram habitadas.
- Ai sim! E por quem?
- Pelos homens serpente – revelou Caburoniq, estremecendo de medo ao dizê-lo.
- De onde vieram eles?
- Do norte, das montanhas proibidas!
- Das montanhas proibidas?
- Pouco depois da morte do vosso pai, quando tu partiste, o teu irmão Boelius foi explorá-las e nunca mais voltou. Pelo que o teu irmão Lubaurus, tendo lhe sucedido na liderança do clã, as interditou para todo o sempre, a fim de evitar mais desaparecimentos.
- E a seguir o que se sucedeu?
- Deu-se uma invasão de serpentes, tendo sido várias as mulheres e crianças que foram atacadas. Depois as culturas secaram e mirraram e por fim os animais sumiram como por magia, restando somente as suas ossadas.
- Foram as serpentes também?
- Não, elas não passam de pequenos animais que apenas seguem o seu instinto de sobrevivência. Foi o Rei das serpentes e o seu exército.
- E como é esse rei das serpentes?
- Enorme, mais ou menos com a altura de oito homens juntos. Tem umas mandíbulas descomunais e é capaz de matar apenas com o seu olhar. Aqueles que não morrem ao olhar-lhe nos olhos ficam petrificados.
- Como lhe sobreviveste tu?
- Na altura em que apareceram, regressava do rio e ao perceber o que estava a acontecer escondi-me, cobardemente.
- Cobardemente! Será alguém cobarde ao zelar pela própria vida?
- Hum.
- Imagina se também tens sido transformado em pedra, quem me contaria agora o que se passou?
- Provavelmente ninguém!
- Cada um tem o seu papel nesta história e o teu foi sobreviver para contar o que se passou aqui.
- Nunca tinha pensado nisso – disse o velho, agora um pouco mais tranquilo. – E o teu papel, qual é?
- Não imagino sequer, – redarguiu sorridente – é isso que pretendo descobrir.
- Hum.
- Não estão todos lá fora, pois não, para onde fugiram os restantes?
- Estão na caverna.
- Voltaram para a caverna?
- Sim!
- Então é para lá que vamos!
- Vamos? Eu não vou, morro de medo só de pensar num possível encontro com tais criaturas.
- Pois bem, então, partirei sozinho aos primeiros alvores.
- Boa sorte!

    Deixando Carburoniq a dormir profundamente, com o pequeno cão aninhado na sua enxerga de peles, Brigus partiu. A partir do ocidente, o sol tingia o céu de amarelo esbatido, porem tudo ali permanecia inerte e em silêncio. A angustia e o desespero nos olhos das estatuas de pedra.
A voz interior que alertara Brigus para um perigo iminente, a quando a sua estadia na aldeia, persistiu audível, mesmo já quando este se havia embrenhando nos bosques confinantes rumo às montanhas rochosas onde se achava a caverna que o seu clã havia habitado durante centenas de estações e que agora lhe servia novamente de refugio. Já não estava longe do seu destino. No entanto, sentindo-se em perigo iminente manteve-se em alerta. Cada passo que dava era uma incógnita. Tudo poderia acontecer!
Sentia já o calor do sol nos ossos, quando vislumbrou no horizonte as montanhas para onde se dirigia. Ali os pássaros cantavam e as árvores tinham frutos. Ansiava por rever os irmãos. Por isso acelerou o passo e quando já descia a vertente que o conduziria ao luxuriante vale onde se achava a caverna, onde segundo Caburoniq estes estariam, escutou um silvo por entre os arbustos. Aquele ou aquilo que o observara, desde que chegara às cercanias, manifestava-se agora.
- Quem está aí? Mostra-te se tens coragem – bradou. O cabo do punhal a vincar os dedos nodosos.
Escutou-se um breve restolhar, os arbustos estremeceram e uma figura atarracada surgiu na sua frente.
- Quem és tu mulher? - inquiriu, continuando a segurar o punhal. Embora a mulher aparenta-se ser inofensiva, como por vezes o perigo costuma advir donde menos se espera, decidiu não facilitar.
- O meu nome é Cailleach e sou a guardiã deste lugar – declarou serenamente, a voz constante e profunda, prenunciadora de um profundo conhecimento.
Era velha, muito velha, parecendo ter sido sempre velha, desde já do começo dos tempos. A sua pele estava engelhada e seca e os seus cabelos eram brancos como a neve. Apenas tinha um dente no maxilar superior e outro no maxilar inferior, o que a par da verruga que exibia no seu nariz adunco lhe dava um aspecto no mínimo caricato.
- A velha sapiente?
- Sim! Há quem me chame assim.
- Como podes, com esse aspecto, ser a guardiã de um lugar?
- Em tempos fui bela e jovem, no entanto a roda do tempo gira e não poupa ninguém. Os anos de luta com o rei das serpentes desgastaram-me até este ponto – confessou, sempre serena.
- Pelo que sei, parece-me que estás a perder a batalha – disse o jovem, indiferente.
- Estou velha e cansada e o meu tempo está a acabar, chegou a hora de dar o meu lugar a outra – disse, agora acabrunhada.
- E procuraste-me tu para me dizeres isso?
- A escolhida vai ser hoje sacrificada ao maldito – revelou, o desespero a vincar o seu rosto. – Deixa que o teu povo se abrigue na caverna, no entanto todos os anos exige-lhe pela época das colheitas metade das mesmas e uma virgem. Se nada for feito este lugar ficará sem quem o proteja e o povo definhará.
- Porque ninguém faz nada? – perguntou, incrédulo.
- Estão tomados pelo medo.
- E o que posso eu fazer para evitar a nossa ruína?
- És o mais destemido e venturoso de todos eles. Vai, desce até à caverna, não deixes que os lacaios do maldito levem a virgem, comanda o teu povo e leva-o a enfrentá-los – exortou, novamente tranquila.
- Isso não irá despontar a ira do maldito?
- Certamente.
- E, então, como faço eu para o derrotar?
- Não sei, terás que te desenvencilhar, mas agora vai, por favor, não deixes que a virgem lhe seja levada.
- Espero que isto valha a pena – declarou o caçador, começando a descer a vertente em direcção à caverna.
- Cada um só tem o que merece – redarguiu Cailleach. – Procura o seu ponto fraco – acrescentou, apressadamente.
Briugus voltou-se para a encarar, mas esta já havia desaparecido… porem no sítio onde estivera estava agora, estendida sobre a urze, uma lança, afilada e com a altura de dois homens, forjada num polido material que jamais alguma vez havia visto. Sentiu-lhe o peso e manuseou-a, cortando o ar ligeiramente. Para além de lhe atribuir mais mobilidade, não pesava mais do que a sua, a qual era de madeira Uma pequena ajuda, pensou.

 
Quando o jovem caçador alcançou a encosta rochosa onde se achava a embocadura da caverna que abrigava o que restava do seu povo quedou-se a olhar para esta. Bem no centro da mesma estava um montículo de terra, onde bem no centro fora cravada uma estaca de madeira. E presa a esta a mais bela das mulheres que já alguma vez havia visto.
Uma figura imponente de tez pálida que não passava despercebida aos olhos de um homem. Tinha um rosto sólido com as maçãs salientes, um nariz soberbo e uns lábios perfeitos e suculentos. Uma cascata de caracóis negros descaíam-lhe pelas costas até às suas ondulantes e sedutoras ancas. Os seios firmes e hirtos. Os olhos eram negros e insondáveis como uma noite de Inverno.
Certamente seria ela a escolhida de que falara Cailleach. Pois para além de estar presa e à mercê do maldito, em seu redor estava também uma quantidade incomensurável de frutas e vagens. O pagamento que este reclamava pela permanência da sua gente naquele lugar.
Brigus desejou-a de imediato. Mas para que tivesse apenas a hipótese de concretizar o seu desejo, teria de convencer o seu povo a desafiar os lacaios do senhor das serpentes. E pior do que isso, enfrentá-lo.
- Quem és tu e o que fazes aqui, és louco? – inquiriu a jovem, nervosamente, assim que Brigus se aproximou.
- Não, não sou louco, mas posso ficar se tu quiseres – replicou, esbugalhando os olhos, parecendo de facto um louco.
- Engraçado – disse, sorrindo ligeiramente.
- Achas graça?
- Acho, mas não podes ficar aqui, vai-te embora antes que eles venham – declarou de novo agitada.
- Eles, quem?
- O meu povo, se pensam que podes pôr a minha segurança em risco irão atacar-te – revelou preocupada.
- És assim tão preciosa para eles? – perguntou, inocentemente.
- Digamos que sou uma oferenda e que se o meu destinatário não me receber matará todos.
- Pois digo-te que também pertenço ao teu povo e que não permitirei que te sacrifiquem por eles. Vou fazer com que lutem pela tua vida e pela terra que lhes pertence por direito.
- Hum. Mas, quem és tu afinal?
- Briugus, filho de Quangeius e irmão de Boelius e de Lubaurus. Devias ser ainda uma criança quando parti. E tu, como te chamas?
- Possivelmente, pois não me recordo de ti… – declarou, parecendo agora menos preocupada. A esperança de poder ser salva a inundar o seu âmago. - Chamo-me Trebaruna e fui resgatada pelo teu, nosso povo, aos lobos da montanha quando ainda era criança.
Brigus procurava na sua mente o que dizer quando um enorme grupo de gente, vindo do interior da caverna, se aproximou. Tinham um aspecto deplorável. O trabalho árduo e os anos de luta haviam-nos corroído, deixando-os macilentos e de olhar encovado. As vestes estavam andrajosas e no seu olhar lia-se desespero.
- Deixa-a em paz, estrangeiro, não foste para aqui chamado – vociferou o líder, determinado.
- Lubaurus, meu irmão, não me reconheces?
- Brigus, és mesmo tu, Brigus? – perguntou, emocionado. – Pensava que nunca mais te veria, meu irmão. Passaram tantos anos!
Escutou-se um clamor de espanto.
- Nós a pedir aos deuses que nos enviassem um herói capaz de nos salvar e eles mandam-nos um pau de virar tripas que segura um espeto – disparou uma mulher, irónica e mordazmente.
- Está calada mulher – vociferou Lubaurus. – A família é sempre bem vinda, por mais dificuldades que possamos estar a enfrentar.
- Aí, sim!... Então porque não esteve ele presente quando mais precisamos? – inquiriu, desafiando-o.
- Já te disse que te calasses, mulher – devolveu Lubaurus, preparando-se para lhe acertar com as costas da mão na face.
- Pára, tem calma irmão – disse Brigus, entrepondo-se entre os dois. – Eu respondo à pergunta – acrescentou, inabalável.
Lubaurus afrouxou o seu impulso e quedou-se para escutar o irmão.
- Eu estou onde os deuses querem que eu esteja e agora é aqui que eles querem que eu esteja – declarou, encarando a mulher do irmão.
- E porque vieste até nós? - questionou, intransigentemente.
- Para vos liderar contra o mal que enfrentam – enunciou, sereno.
Escutou-se um clamor, a esperança do povo renascera nas palavras do jovem caçador.
- Este mal que enfrentamos está para além do inimaginável – declarou Lubarurus, a encarnação do desalento. Acreditava que a única forma de resolver as suas dificuldades fosse corresponder a todas as exigências do maldito.
Pelo menos conseguira manter o povo vivo, o que Brigus considerava um grande feito, no entanto insuficiente. Aquelas terras haviam sido prometidas pelos deuses ao seu pai, pela sua memória tinham de lutar pela continuidade da sua presença nelas.
- Pelos deuses, a noite está a chegar e não tarda que eles venham buscar a rapariga, é prudente que nos recolhamos – disse Lubaurus, medroso.
- Querem continuar a passar fome e a entregar as vossas filhas ao maldito ou preferem repor a ordem, a estabilidade e a felicidade? – perguntou, a plenos pulmões.
Escutou-se um novo clamor. O povo estava entusiasmado e queria colocar termo aquela situação angustiante. Os caçadores batiam com as lanças na terra chã e com as espadas nos escudos. Trebaruna sorria, iria continuar a viver, casar e ter filhos. Talvez com Brigus, ele era o candidato ideal. Forte, destemido e sem receios.
- E o que pretendes tu fazer, meu estimado irmão? - perguntou Lubarus.
- Enfrentar os soldados do maldito – confessou.
- Mas isso é uma loucura!
- Não, não é! Quem de vós dos presentes nunca fez cair um caçador inimigo por terra?
Todos o tinham feito, nem que tivesse sido só por uma única vez.
- O que têm estes de diferente dos outros?
- Nada!
- Então enfrentemo-los esta noite.
- E quando o maldito vier ver porque não regressaram os seus lacaios com os seus prémios?
- Confias em mim ou não?
- Confio!
- Deixa que eu depois trato dele – declarou, determinado em seguir em frente com o plano que tinha em mente.
- Diz-me, então, meu irmão, quantos soldados costumam vir buscar as raparigas?
- Cerca de vinte.
- Óptimo! Somos três vezes mais, o que nos vai facilitar a tarefa. E por onde surgem?
- Ao longo do vale.
- Hum. Estou a ver! Coloquem armadilhas ao longo da sua extensão. Pois quando chegarem até nós, serão ainda menos.
- Assim faremos!
- Agora liberta Trebaruna e leva-a mais as outras mulheres e as crianças para a segurança da caverna. Mas, deixa ficar a comida e a estaca tal e qual como estão, irei precisar delas para mais tarde.
- E onde nos posicionaremos?
- Aguardamo-los nas vertentes. E atacamos quando se aproximarem da caverna.
- Pois bem!
A noite surgiu negra e gélida, quebrada por gritos de terror e dor. As armadilhas haviam resultado!
Nunca o clã do javali havia dado luta aos guerreiros serpente, pelo que os poucos que alcançaram a caverna estavam receosos e amedrontados. Quando os caçadores caíram sobre si, a sua resistência foi mínima pelo que os levaram de vencida facilmente. Felizmente ninguém morrera, apenas um jovem caçador, ansioso e descuidado havia ficado ferido.
Já a noite ia alta e os sórdidos e ofídios restos mortais do inimigo haviam sido consumidos completamente pelo fogo, quando Lubaurus abordou um taciturno e meditativo Brigus.
- Não tardará que o maldito surja para verificar o que aconteceu aqui – disse Lubaurus, agora mais confiante, mas ainda assim receoso pelo desfecho da sua ousadia.
- Deixa que venha – replicou Brigus, enquanto limpava, das suas vestes, o sangue do inimigo.
- Mas…
- Leva-os a todos para a caverna, deixa-os em segurança e regressa sozinho. Traz-me crina de cavalo negra e um vestido de mulher.
A crina era utilizada pelo clã para manufacturar corda.
- Que raio de ideia é a tua?
- Traz-me o que te pedi, que logo verás!
Lubaurus desapareceu no interior da caverna e instantes depois regressou com aquilo que o jovem irmão lhe pedira.
- Temo por ti – confessou o irmão mais velho.
- Não temas! Os anos em que estive ausente, a combater as mais vis das criaturas, prepararam-me para este momento. Confia no sangue do teu sangue.
- Confiarei – redarguiu, abraçando o irmão comovidamente. – Posso fazer mais alguma coisa por ti?
- Podes! Regressa para a caverna e aguarda, mantendo os outros tranquilos.
- Que assim seja!
Brigus vestiu o vestido que solicitara ao irmão e com a crina de cavalo simulou uma farta cabeleira de mulher. Ocultou a lança que Cailleach lhe cedera, perto da estaca, e encostou-se a esta tal como se tivesse amarrado à mesma. O embuste estava preparado, restava-lhe agora aguardar pela chegada da criatura ofídia.
A lua, um obre cheio e prateado, iluminava o local. Brigus sabia bem o que fazer, no entanto disciplinava a mente para que jamais em alguma circunstância viesse a olhar directamente nos olhos da criatura. Pois se ficasse transformado em pedra deitaria tudo a perder. Ao longe escutava-se o lamento do lobo e o choro do corvo.
De súbito Brigus escutou movimento, não por onde esperava ver a hedionda criatura surgir, mas sim proveniente do lado oposto, no sentido da caverna. Era Trebaruna, quem vinha na sua direcção.
- O que fazes aqui, estás louca?
- Não, não estou louca, mas posso ficar se tu quiseres?
- Onde já ouvi, eu, essas palavras?
Ambos riram.
- Vim apenas agradecer-te por me teres salvo a vida – declarou, alegre e sorridentemente.
- Pronto, está bem, já agradeceste! Agora vai para junto dos outros e procura mantê-los calmos.
- Irei, mas não sem antes te mostrar o que te espera caso venças a criatura – declarou, beijando-o em seguida nos lábios.
- Vencerei – disse o jovem guerreiro, agora ainda mais determinado em levar o rei das serpentes a cair por terra, pela perspectiva de sentir novamente aqueles lábios quentes e carnudos a tocarem os seus.
Trebaruna acabou por ir-se juntar ao restante clã, na aparente segurança da caverna e ele, o maldito, o hediondo e descomunal, o rei das serpentes emergiu por entre a escuridão.
Caburoniq não se havia poupado na descrição que fizera ao jovem caçador, exagerando largamente, ainda assim a criatura era detentora de um tamanho descomunal. A sua hedionda cabeça estava já bem perto de Brigus enquanto a cauda ainda não se vislumbrava.
Os seus olhos, dois enormes orbes vermelhos e luzidios, brilhavam na noite, procurando atrair o olhar dos mais incautos. Das suas descomunais mandíbulas, tais lâminas lancinantes, escorria uma seiva pestilenta e pútrida.  Do seu corpo couraçado e escamoso emanava um odor repugnante e nefasto. E com a sua língua, bifurcada e porosa, sondava a área em busca dos seus lacaios desaparecidos.
Não detectando quaisquer sinais dos seus comparsas, serpenteando-se vorazmente, depressa alcançou a pretensa virgem. Por instantes engoliu o embuste que o jovem caçador lhe havia preparado, permanecendo quedo, mas depressa os seus elevados instintos detectaram a fraude e enfurecido, soltando um agonizante e ensurdecedor silvo ergueu-se altivo, preparando-se para mergulhar sobre o impostor que o usara desafiar, a fim de o engolir vivo.
Brigus, caçador e guerreiro experimentado, embora nunca tendo encarado a nefasta criatura olhos nos olhos, desde que esta entrara na clareira, nunca desviou o olhar da mesma. Por pouco não descobria o seu ponto fraco, mas quando o maldito se ergueu nas alturas, os seus olhos de lince apressaram-se a procurá-lo, encontrando-o. A sua dura e espessa couraça de escamas cobria-lhe todo o corpo no entanto a garganta encontrava-se a descoberto. Teria de agir rápido.
O monstro escancarou a sua bocarra descomunal, libertando um odor fétido que por instantes revolveu as entranhas do jovem caçador. Tão célere, tal como se erguera, assim se deixou cair sobre a sua pretensa vitima. Porem, quando o fez era já tarde para si. Brigus desembaraçara-se com facilidade das amarras que o seguravam ao poste. Em seguida, pegou na lança que havia ocultado entre as frutas e as vagens e postando-se ajoelhado ergueu-a apontando a ponta desta ao único ponto a descoberto da besta.
 A velocidade com que o rei das serpentes se deixou cair sobre Brigus para o abocanhar era tal que foi o suficiente para que a lança se enterrasse por completo na sua garganta. Um grito de dor ecoou atroador por toda região, e o ofídio e pesado corpo do maldito tombou com estrondo sobre a terra chã, contorcendo-se em agonizantes espasmos. Os pássaros sobressaltados abandonaram as copas das árvores e o lamento do lobo emanou lúgubre.
- Estamos livres, podem abandonar a caverna, os olhos do maldito fecharam-se para sempre – bradou o jovem caçador, tomado pelo o entusiasmo da proeza que havia acabado de conseguir realizar.
Aos poucos e poucos o restante clã foi emergindo da caverna. A raiva que sentiam pela tirânica criatura era tanta que se apressaram na sua direcção, acometendo da melhor maneira que podiam sobre o corpo que agora jazia praticamente inerte, bloqueando quase por completo a embocadura do abrigo. Se havia alguma réstia de vida na criatura esta depressa se esvaeceu.
De súbito, como por artes mágicas, o nauseabundo cadáver transformou-se em pó que rapidamente se dissipou com o vento. E um audível clamor de deslumbramento e alegria escutou-se. Trebaruna correu a beijar o herói e o povo carregou-o em ombros.
As gentes que estavam petrificadas regressaram à sua forma natural. Boélius regressou das montanhas proibidas, nas quais estivera também ele petrificado durante anos. E Caburoniq pôde contar novamente histórias às crianças.
Brigus dominou a serpente que oprimia o clã do qual, com todo o mérito, se tornou chefe. Desposou a jovial e enigmática Trebaruna, a qual cuidou maternalmente dos demais. E ainda hoje, milénios depois de ambos terem sido idolatrados como deuses, pelas gerações vindouras, os seus nomes se escutam em Finisterra, onde a sua presença divina é também ainda sentida.

Ricardo Alves